Um sistema regulatório bem estruturado e atualizado pode mitigar riscos tornando o setor bancário mais seguro e apto para atender seus clientes. Em seu estudo recente “US Bank Failures: The Emerging Regulatory Focus” (Falhas de Bancos dos EUA: O Foco Regulatório Emergente, em tradução livre), a Capco, consultoria global de gestão e tecnologia dedicada ao setor de serviços financeiros do Grupo Wipro, faz uma análise dos impactos da recente crise de bancos americanos Silicon Valley Bank (SVB), Signature Bank e Silvergate Bank para a indústria financeira e aponta sete gestões de riscos que precisam ser aprimoradas no país. O paper destaca que ao expor as falhas ocorridas, a crise também revelou que avanços regulatórios são urgentes para as instituições americanas.
De acordo com a consultoria, ao aprimorar suas leis bancárias, os americanos poderão controlar e evitar riscos financeiros e de mercado que trazem impactos negativos para clientes e negócios porque os bancos estarão sujeitos a uma supervisão maior e poderão, com isso, ter maior resiliência empresarial. “Espera-se que os eventos recentes envolvendo o SVB, o Signature Bank e o Silvergate Bank pressionem as instituições bancárias a examinar e racionalizar sua governança corporativa e seus sistemas de medição e monitoramento de riscos”, explica Camille Ocampo, diretor executivo da Capco.
A crise americana ganhou destaque quando, no dia 12 de março deste ano, órgãos financeiros dos EUA (Departamento do Tesouro, Federal Reserve Board-FRB e o Federal Deposit Insurance Corporation FDIC) anunciaram ao público medidas para proteger depósitos dos clientes nos bancos em um programa de empréstimos de emergência. Essas ações foram decididas em conjunto, inclusive com a presidência do país, para lidar com um risco sistêmico do setor bancário. Os órgãos envolvidos informaram que farão a contabilidade e a análise completa do que ocorreu, revisando a regulamentação existente para que os responsáveis sejam responsabilizados. Além disso, devem divulgar um relatório completo no início de maio.
A crise chama a atenção de todo o mundo pela importância dos EUA e de seu sistema financeiro na economia global e, portanto, por seu potencial impacto em outros mercados. Porém, no caso do Brasil, as falhas que levaram à falência dos três bancos norte-americanos não devem se repetir aqui. O motivo é que a regulação do Banco Central brasileiro é mais rígida e com maior controle de riscos, além de acompanhar e controlar as mudanças das taxas de juros e possuir mecanismos de regulamentação para funcionamento de fintechs e bancos digitais que, para oferecerem serviços como carteira digital, por exemplo, devem ter qualidade de capital mínimo semelhante ao de bancos tradicionais.
Embora esteja bem-preparado nessa área, o Brasil pode reter lições que os americanos estão aprendendo — com o recente episódio para continuar melhorando o sistema bancário nacional. Esse aprimoramento local poderá vir também de novas regras que os EUA venham a implantar. De acordo com os especialistas da Capco, os sete tipos de riscos presentes no sistema bancário dos EUA que precisam ser melhorados são:
1) Gestão do balanço: Precisa ser abrangente e ter todos seus índices medidores dentro de tolerâncias de risco definidos de forma constante. Isso é necessário porque, em busca de retornos mais altos e em investimentos mais longos, há queda do valor desses ativos em ambientes de taxas crescentes e até então não estão sujeitos a requisitos de reserva de capital baseados em risco.
2) Base de clientes: precisa ser melhor entendida e gerenciada para evitar concentrações, que são danosas porque em caso de falhas desmoronam de uma vez. Ao passo que se forem bem geridas e distribuídas podem ser menos impactadas por falhas. Os bancos precisam entender o ambiente operacional e financeiro de seus clientes e os riscos de liquidez decorrentes dos modelos de negócios de cada um deles.
3) Pagamentos mais rápidos: Os rápidos fluxos de saída e a velocidade com que os saques dos clientes ocorrem podem resultar em uma “corrida” quase imediata ao banco. Em resposta, os bancos devem ajustar seus planos de liquidez. Os alertas para possíveis saídas de depósitos devem ser implementados e monitorados com frequência.
4) Comunicação: Os bancos precisam considerar cuidadosamente o momento das comunicações, as mensagens, os canais de distribuição, as pessoas e o público envolvido e os ciclos de feedback porque quando mal realizadas fazem com que investidores e o público percam a confiança na posição financeira de um banco. Isso inclui revisar o manual de gestão de crises para aprender a lidar com as “câmaras de eco” da mídia social, onde opiniões e narrativas são moldadas e disseminadas em velocidade e escala pela imprensa, influenciadores de mídia social, clientes, vendedores a descoberto e concorrentes.
5) Gestão de Risco de Taxa de Juros: Especificamente falando dos EUA, embora as recentes falências bancárias possam fazer com que o Federal Open Market Committee (FOMC) interrompa temporariamente o ritmo de aumento das taxas para avaliar os riscos econômicos, os bancos devem continuar antecipando um aumento da meta para a taxa dos fundos federais em 2023.
6) Gestão e Pessoal: Os bancos devem garantir que contratem e retenham pessoal qualificado na gestão de riscos críticos e nas áreas operacionais do banco. O Conselho deve fazer perguntas vitais sobre a robustez da estratégia e práticas de pessoal do banco e investir constantemente em talentos das áreas de risco e conformidade.
7) Dados de depósito: Os bancos também precisarão considerar seus dados de depósito. É fundamental para as Instituições Cobertas (CI) com mais de dois milhões de contas de depósito manter as informações completas e precisas do cliente necessárias ao FDIC para determinar o seguro de depósito cobertura em tempo hábil com relação a cada conta de depósito.
As recentes falhas dos bancos americanos deixam muitos aprendizados. A tendência é que estejam sujeitos a maior supervisão, incluindo regulamentações mais rigorosas para identificar e fechar vulnerabilidades financeiras e de mercado que representam um impacto negativo aos clientes e ao mercado. “À medida que consideramos as lições aprendidas até agora com a situação atual e examinamos se as ações tomadas pelo governo do presidente norte-americano Joe Biden podem isolar esses impactos, os bancos devem encontrar um equilíbrio significativo entre gerar lucros e navegar pela complexidade regulatória”, salienta Camille Ocampo.